
O Rabino Dr. Shlomo Pereira é director de educação no Chabad da Virgínia, Richmond, e director fundador do RVA – Centro de Estudos Judaicos. É autor ou co-autor de vários livros, entre os quais “Vozes Judaicas de Portugal” e “Ética Judaica de Portugal”, e dá palestras extensivas em todo o mundo sobre a história dos Judeus da Península Ibérica e do Mundo Sefardita em geral. O Rabino Dr. Shlomo Pereira é também professor universitário e economista com ampla lista de publicações.
Pode contactar o Rabino Pereira por e-mail para shlomo@chabadofva.org
1835
As portas da sinagoga de Gaza são salvas e levadas para Hebron
Depois de ter alcançado grande destaque no século XVII, no final do século XVIII, Gaza tinha uma pequena mas activa comunidade judaica. No início de 1799, Napoleão liderou o seu exército na conquista das cidades costeiras da Palestina. Quando capturou Gaza verificou que a maioria dos judeus, temendo o pior, tinha fugido para Hebron antes da sua chegada. Os restantes judeus abandonaram a cidade quando descobriram que Napoleão não conseguiu impedir os soldados franceses e os árabes locais de abusarem dos poucos residentes judeus que tinham permanecido. A sua fuga marcou o fim temporário da presença judaica na área. Em 1811, praticamente já não havia judeus em Gaza, e a sua principal sinagoga estava abandonada. Entretanto, Hebron tinha uma presença judaica contínua e uma sinagoga histórica chamada Avraham Avinu (Nosso Pai Abraão) construída em 1540. A comunidade judaica de Hebron acolheu os refugiados de Gaza, e estes, por sua vez, mantiveram a sua ligação com o seu antigo lugar de residência e viva a memória da sinagoga de Gaza. Em 1835, ocorreu um ponto de viragem quando, durante a guerra entre o Império Otomano e a província rebelde do Egipto, Ibrahim Pasha, o governante egípcio da região, ordenou o desmantelamento do antigo edifício da sinagoga em Gaza. As suas pedras seriam reutilizadas para construir uma fortaleza na vizinha Ashkelon. Ao tomarem conhecimento que a sinagoga abandonada de Gaza iria ser destruída, os antigos residentes judeus de Gaza que agora viviam em Hebron agiram rapidamente. De imediato se deslocaram de volta a Gaza para resgataram as grandes portas de madeira decoradas da sinagoga antes de o edifício ser demolido. Estas portas, esculpidas em madeira de sicómoro e adornadas com símbolos judaicos, seriam os únicos vestígios da sinagoga de Gaza. Segundo relatos da época, as portas recuperadas foram levadas para Hebron num comboio de carroças ou camelos. Em Hebron, instalaram as portas de Gaza como portas de entrada da Sinagoga Avraham Avinu, dando assim, efectivamente a estes artefactos um novo lar. Cartas e relatos contemporâneos enfatizam a importância deste acto: mesmo décadas mais tarde, os anciãos de Hebron contavam como o povo de Gaza que veio para Hebron trouxe consigo as portas de madeira da antiga sinagoga de Gaza e as fixou na antiga sinagoga de Hebron. Os historiadores notam um eco poético nesta história: na Bíblia, diz-se que o herói Shimshon carregou as portas de Gaza e depositou-as numa colina perto de Hebron (Juízes 16:3). Num sentido espiritual, a mudança das portas da sinagoga de Gaza para Hebron no século XIX reflectiam este antigo evento, destacando como as portas de Gaza encontraram refúgio em Hebron. As portas da sinagoga de Gaza permaneceram no mesmo local na Sinagoga Avraham Avinu de Hebron durante aproximadamente 94 anos. Não só reforçaram a santidade da sinagoga de Hebron, como também lembraram aos fiéis a outrora próspera vida judaica em Gaza. Durante este período, não só a comunidade judaica de Hebron continuou a florescer, como a presença judaica em Gaza foi renovada, sem, no entanto, se aproximar dos patamares atingidos no seu passado glorioso. Tragicamente, a história chegou a um fim amargo em 1929. Nesse ano, uma onda de revoltas anti-judaicas varreu a Palestina sob Mandato Britânico, e Hebron foi palco de um horrível massacre. Multidões árabes atacaram a comunidade judaica de Hebron no final de agosto de 1929, matando 67 judeus e obrigando os sobreviventes a fugir da cidade. Na violência, a Sinagoga Avraham Avinu – incluindo as suas preciosas portas – foi saqueada e profanada. Testemunhas oculares descreveram mais tarde o interior da sinagoga como destruído, com livros sagrados rasgados e móveis partidos. As preciosas portas de madeira de Gaza perderam-se no meio da destruição. Não é claro se foram queimados no ataque ou roubados posteriormente, mas não foi encontrado qualquer vestígio delas. Menos de um século depois de terem sido salvas, as portas da sinagoga de Gaza tiveram o mesmo destino da comunidade que as preservou. Durante décadas após 1929, Hebron não teve qualquer comunidade judaica, pois sob o domínio da Jordânia, os judeus estavam proibidos de regressar à cidade. A Sinagoga Avraham Avinu estava em ruínas – chegou a ser utilizada como curral de cabras e depósito de lixo em meados do século XX. Quando Israel retomou o controlo de Hebron, em 1967, a sinagoga foi reconstruída e concluída em 1977, mas as portas originais de Gaza desapareceram para sempre. No entanto, a história das portas da sinagoga de Gaza continua a ser significativa na história judaica. Ela recorda-nos a vida judaica florescente na Cidade de Gaza em séculos anteriores e as suas ligações a outras comunidades judaicas na Terra de Israel.
1628
R. Israel Najara, o grande poeta litúrgico, morre em Gaza
O R. Israel ben Moshe Najara [c.1550-c.1625] um cabalista e rabino, mais conhecido pelos seus poemas litúrgicos, nasceu em Safed e estudou com o seu pai R. Moshe Najara [c. 1510-1581] e o seu avô materno, o R. Israel ben Meir di Curiel [1501-1573]. A família Najara era originalmente de uma cidade com o mesmo nome na parte norte da Península Ibérica, mas teve de fugir com a expulsão de 1492. A família estabeleceu-se primeiro em Salónica e posteriormente em Safed, onde permaneceram até 1579, altura em que após um ataque aos judeus de Safed, a família Najara partiu e se estabeleceu nos arredores de Damasco. Depois disso, o R. Israel Najara passou por várias cidades otomanas, acabando por se estabelecer em Hebron. Em 1619, no entanto, uma epidemia levou a maioria dos judeus de Hebron a se mudarem para Gaza. Na Cidade de Gaza, o R. Israel Najara exerceu actividade como rabino e professor da comunidade até ao seu falecimento em 1628. Está enterrado no antigo cemitério judeu da cidade. O seu filho, o R. Moshe Najara, sucedeu-o como rabino da comunidade judaica de Gaza. A fama do R. Israel Najara repousa na sua prolífica actividade nos campos da poesia sagrada e piyyutim litúrgicos. As suas centenas de poemas são excelentes trabalhos tanto em termos da sua linguagem como quanto ao seu estilo e, assim sendo, não surpreende que tenham alcançado ampla circulação no mundo judaico. Entre os poemas mais conhecidos do R. Israel Najara estão 'Yah Ribon Olam' [Senhor do Mundo], uma canção popular de Shabat em aramaico, e seu 'Ketubbah LeChag HaShavuot' [Contrato de Casamento para Shavuot], um poema comparando o pacto entre Israel e D'us no Monte Sinai com uma cerimónia de casamento, o qual é lido em muitas comunidades sefarditas em Shavuot. Além disso, muitos dos seus piyyuṭim foram incorporados aos rituais e orações judaicas em lugares como Aleppo, Israel, Itália, Marrocos, Síria e Turquia, só para citar alguns. Curiosamente, alguns dos seus poemas foram também adoptados, primeiro nos rituais Caraítas e depois nos rituais Shabbateanos, em ambos os casos por grupos sectários no judaísmo. Do extenso trabalho do R. Israel Najara, apenas uma pequena parte foi publicada, a maioria estando ainda em forma de manuscrito. A publicação mais antiga das suas obras foi 'Zemirot Israel' [Canções de Israel], impressa em Safed em 1587, e que consiste em 109 poemas para todos os dias da semana, e para Shabat, dias santos e cerimónias ocasionais. Este livro teria mais duas edições ainda antes do final do século, a terceira das quais, em Veneza em 1599, foi uma versão bastante ampliada com 346 poemas, incluindo 'Meimei Israel' [Águas de Israel], uma série de poemas seculares e amorosos compostos na sua juventude. Por sua vez, ‘Mesacheket baTevel’ [Alegria no Mundo], foi impresso em Safed, também em 1587, e é um livro de instrução moral sobre a trivialidade do mundo. Publicações posteriores incluem 'Kli Machazik Beracha' [Ferramenta para fortalecer a bênção] sobre a graça após as refeições, 'Shochatey HaYeladim' [Abate ritual para crianças], sobre as leis do abate ritual em forma poética composta a pedido de seu filho Moshe. Além disso, algumas de suas obras não existem, como 'Ma'arkot Israel' [As Batalhas de Israel], um comentário à Torá e 'Mikveh Israel' [A Esperança de Israel], um conjunto de quarenta homilias. Além disso, do seu 'Pitzey Ohev' [Feridas de Amor], um comentário sobre Job, apenas algumas páginas das porções finais existem. Apesar do enorme e duradouro sucesso do R. Israel Najara, o seu trabalho não deixou de gerar alguma polémica. Ele seguiu a tradição dos grandes poetas judeus do período hispano-árabe, mas, ao mesmo tempo, empregou frequentemente formas e conteúdos originais influenciados por estilos e melodias alienígenas. Na verdade, na sua juventude escreveu uma boa dose de poesia secular. Para mais, parece que terá adaptado para alguns destes poemas melodias árabes ou turcas então populares, as quais aparentemente terá aprendido em lugares de reputação questionável. Apesar destas acusações, o grande mestre R. Yitzchak Luria [1534-1572] declarou que os hinos do R. Israel Najara eram ouvidos no céu com prazer.
1665
Rabino-Chefe Sefardita Moshe Galante
O R. Moshe Galante, foi um importante estudioso oriundo de uma distinta família de exilados ibéricos 1492, que se estabeleceu na Terra de Israel em meados do século XVI. Em 1665, o R. Moshe Galante tornou-se o líder de facto dos judeus da Terra de Israel, ao ter assumido a posição de Rabino-Chefe Sefardita de Jerusalém, uma posição oficial reconhecida pelas autoridades centrais otomanas. ——— O R. Moshe Galante [1620-1689] nasceu em Safed em 1620. A família Galante produziu uma linhagem aristocrática de rabinos sefarditas. O primeiro desta linhagem, o R. Mordecai, estabeleceu-se em Roma após a expulsão de Espanha em 1492. Inicialmente, o nome da família era Angel, mas as maneiras delicadas do R. Mordechai levaram-no a ser conhecido pelo sobrenome "Galantuomo" (gentil-homem), um nome que a família manteria a partir de então. Após o seu falecimento e, 1541, os seus filhos emigraram para a Terra de Israel e, a partir desse momento, a história da família ficou para sempre ligada com a história da Terra de Israel e das regiões adjacentes. O R. Moshe Galante era filho do R. Yonatan Galante e neto do R. Moshe Galante [1540-1614], referido como o ancião, o qual tinha sido estudante do R. Yosef Karo [1488-1575]. O R. Galante estudou em Safed com o R. Baruch Barzilai. Mais tarde, mudou-se para Jerusalém, onde eventualmente se tornou um rabino de distinção e chefe da Yeshiva Beit Yaakov. O R. Moshe Galante foi considerado o maior na sua geração em termos de sabedoria e piedade. Foi assim considerado num momento em que, diz a tradição, havia em Jerusalém oitenta e sete estudiosos da Torá do maior calibre. Ainda assim, todos os estudiosos da Torá na cidade reconheciam o seu conhecimento da Torá e curvavam-se à sua autoridade e deferiam perante as suas opiniões. No entanto, como manifestação da sua grande humildade, ele recusou-se a usar o título de rabino chefe de Jerusalém. De facto, ele e os outros estudiosos instituíram uma regra oficial no sentido de que o título de rabino não fosse usado em Jerusalém, para que ninguém tivesse autoridade sobre os demais. Consequentemente, ele seria apenas referido como o Rishon Letzion. O R. Moshe Galante serviu como o primeiro Rishon Le'zion, Rabino-Chefe de Jerusalém, de 1665 até falecer em 1689. O título Rishon L'Tzion ("O primeiro de Zion"), era um termo derivado de Isaías 41:27, o qual, a partir de então, seria tradicionalmente conferido ao Rabino-Chefe Sefardita de Jerusalém e, posteriormente, da Terra de Israel, posições oficialmente reconhecidas pelas autoridades centrais otomanas. De notar que até ao início do século XIX, os judeus sefarditas tinham uma presença fortemente dominante em Jerusalém, bem como no resto da Terra de Israel. Assim sendo, o Rabino-Chefe Sefardita de Jerusalém era, por extensão, efetcivamente o Rabino-Chefe da Terra de Israel. Sabe-se que o R. Moshe Galante, como muitos rabinos dessa era, foi durante algum tempo influenciado pelo movimento Shabateano. Em 1665 foi com outros rabinos, de Jerusalém a Gaza onde o R. Nathan de Gaza, mais tarde considerado como o falso profeta do falso messias Shabbetai tzvi, então vivia. No final de 1665, o R. Galante estava em Aleppo e, de acordo com relatos locais, acompanhou Shabbetai Tzvi a Smyrna e Constantinopla. Eventualmente, diz-se que se afastou do movimento e condenou Shabbetai Tzvi mesmo antes da sua apostasia para o Islão no final de 1666. A causa imediata é citada como tendo sido ele ter testemunhado ver Shabbetai Tzvi assinar uma carta na qual não apenas escreveu o nome de quatro letter de D'us, mas o aplicou a si mesmo. O R. Moshe Galante escreveu, entre outros livros, Zevach Hashelamim [Oferta de Paz] sobre o Talmude, uma harmonização de passagens bíblicas contraditórias e bíblicas com declarações talmúdicas; Ḳorban Chagigah [Ofertas de Festivais] sermões para os três festivais e explicações sobre o Tractate Chagigah e sobre os escritos legais de Maimonides; e Parpara'ot L'Cochmah [Delícias da Sabedoria] um comentário sobre a Bíblia. Além disso, ele escreveu Elef HaMagen [Mil Escudos Protectores], que inclui 1.000 respostas jurídicas sobre vários tópicos. De facto, o R. Moshe Galante é frequentemente chamado de Rav HaMagen em referência a este trabalho. Entre os alunos do R. Moshe Galante encontram-se o R. Moshe Ibn Habib [1654-1696], seu cunhado que o sucedeu como Rishon Letzion, o R. Chezekiah da Silva [1659-1698], autor de Pri Chadash, o R. Israel Yaakov Chagiz [1620-1674], seu genro e pai do R. Moshe Chagiz [1672-C.1750] e o R. Abraham Yitzchaki [1661-1729], que também viria a ser Rishon LeTzion entre 1709 e 1729. O R. Moshe Galante morreu em Jerusalém em 1689 e está sepultado no antigo cemitério judaico do Monte das Oliveiras.
1839-1840
R. Yehudah Bibas
O R. Yehuda Bibas é o primeiro rabino que se sabe ter defendido aberta e fortemente o regresso dos judeus à Terra de Israel, e tal ter feito muito antes do estabelecimento formal do movimento político sionista. Apesar da sua falta de qualquer sucesso significativo em termos da Aliyah real e da sua morte prematura, as ideias e esforços do R. Bibas deixaram uma marca indelével. As suas ideias pioneiras inspiraram muitos que mais tarde abraçaram a causa da restauração judaica na Terra de Israel. ——— R. Yehudah Bibas (1789-1852) nasceu em Gibraltar no seio de um família sefardita descendente de judeus expulsos de Espanha em 1492. Por parte da mãe, era neto do ilustre rabino marroquino Chayim inn Attar (1696-1743), conhecido como Or HaChayim em homenagem ao seu livro mais famoso. A família do seu pai por seu lado tinha raízes na comunidade judaica de Tetuán, no Marrocos espanhol. Após a morte do pai, o R. Bibas mudou-se para Livorno, Itália, onde viveu com o avô. Livorno, um centro vibrante de cultura e estudos judaicos, moldou o seu crescimento intelectual e espiritual. Aí, seguiu a educação religiosa e secular, obtendo a ordenação como rabino e a certificação como médico. Além disso, desenvolveu fluência em várias línguas, incluindo inglês, italiano, espanhol e hebraico, o que lhe permitiria interagir com públicos muito diversos. Regressado a Gibraltar, o R. Bibas tornou-se um líder respeitado na comunidade judaica e estabeleceu uma yeshiva que atraíria estudantes de todo o Mediterrâneo. Em 1810, viajou para Londres, onde conheceu Sir Moses Montefiore (1784-1885), um proeminente filantropo judeu e defensor do realojamento judaico na Palestina, com quem R. Bibas partilhou uma visão de um renascimento judaico autossustentável na Terra de Israel. De 1831 a 1850, R. Bibas serviu como rabino da comunidade judaica na ilha de Corfu, então parte da República de Veneza e mais tarde sob controlo britânico. Durante o seu mandato, ficou profundamente desiludido com a situação judaica no exílio, que via como uma profanação do nome de D'us. Começou a defender a imigração judaica em massa para a Terra de Israel, vendo-a como essencial para a renovação espiritual e nacional. Vivendo a Guerra da Independência Grega (1821-1832), R. Bibas testemunhou a luta bem-sucedida dos gregos contra o domínio otomano e inspirou-se na sua vitória. Ao observar o enfraquecimento do Império Otomano, acreditava que era o momento certo para a autodeterminação judaica. Propôs que os judeus, tal como os gregos, pudessem ascender e reivindicar a soberania na sua pátria ancestral. As suas ideias eram revolucionárias para a época, mas ele expressou-as em termos judaicos tradicionais, alinhando-as com os ensinamentos religiosos e enfatizando a educação como uma chave para o renascimento nacional. Especificamente, R. Bibas expandiu o conceito de Teshuvá (arrependimento ou “regresso”) para incluir um regresso colectivo à Terra de Israel. Argumentou, com base em Deuteronómio 30:1-11, que o regresso a Israel representava uma reconciliação nacional com D'us, tal como o exílio era o resultado do afastamento espiritual da nação. Esta redefinição de Teshuvá tornou-se a pedra basilar da sua defesa da Aliyah. Entre 1839 e 1840, R. Bibas fez uma extensa viagem pela Europa e Norte de África, instando as comunidades judaicas a apoiarem o realojamento na Palestina. O momento desta viagem é muito revelador, pois 1840 correspondeu ao ano hebraico de 5600 e estava, como tal, imbuído de elevadas esperanças messiânicas de redenção. A sua missão começou em Corfu, viajando para Salónica e depois para Belgrado, onde conheceu o R. Yehudah Alkalai (1798-1878) em julho de 1839. Durante as discussões, o R. Bibas citou os ensinamentos do R. Eliyahu, o Vilna Gaon (1720 –1797) sobre a Aliyah e o estabelecimento de assentamentos judaicos. Embora o R. Alkalai já tivesse escrito o seu tratado pioneiro, Shema Yisrael, em 1832, defendendo o regresso à Terra de Israel, este encontro influenciou significativamente o seu pensamento. R. Bibas continuou as suas viagens, visitando a Valáquia e a Moldávia, onde proferiu discursos em cidades como Raila e Bucareste. Daí, mudou-se para oeste, visitando Viena, Leipzig, Frankfurt e Londres. Em Livorno, voltou a contactar com conhecidos da sua juventude e começou a planear os próximos passos da sua defesa de direitos. No inverno de 1850, a esposa do R. Bibas, Rachel, faleceu, o que o levou a acelerar os seus planos de se estabelecer na Terra de Israel. Depois de anunciar a sua demissão do cargo de rabino de Corfu, embarcou na sua viagem para a Palestina, via Istambul. A 6 de fevereiro de 1852, acompanhado por dois estudantes, chegou ao porto de Jafa. Depois de passar algum tempo em Jafa e Jerusalém, o R. Bibas estabeleceu-se em Hebron, onde abriu uma yeshivá e uma extensa biblioteca. Na altura, a comunidade judaica de Hebron era constituída por cerca de 500 pessoas, e a sua chegada, juntamente com a sua liderança e extraordinária biblioteca, foram contribuições significativas para a cidade. Tragicamente, o R. Bibas faleceu apenas dois meses depois de ter chegado a Hebron. Morreu inesperadamente enquanto fazia um sermão na sinagoga. Foi sepultado no Antigo Cemitério Judaico de Hebron. Os seus escritos foram perdidos ou destruídos e, sem descendentes sobreviventes, grande parte do seu legado depende da sua influência sobre outras pessoas. Apesar da sua morte prematura, as ideias e os esforços do R. Bibas deixaram uma marca indelével. A sua visão de um Estado judaico enraizado tanto na renovação espiritual como na soberania nacional lançou as bases para o sionismo político moderno.
Os anos 1700s
A maioria da presença judaica na Terra de Israel no século XVIII estava concentrada nas chamadas Quatro Cidades Santas — Jerusalém, Hebron, Safed e Tiberíades, com várias comunidades judaicas mais pequenas em vários outros locais. Aqui, concentramos a nossa atenção no caso de Jerusalém. ——— Durante os anos 1700s, Jerusalém era de longe a cidade com a comunidade judaica mais importante na Terra de Israel. Isto é verdade quantitativamente. Estima-se que por volta do início do século, a população judaica em Israel era de cerca de 2.000 pessoas, sendo que cerca de 1.500 viviam em Jerusalém. Por sua vez, por volta do fim do século, as estimativas indicam uma presença judaica de cerca de 7.500 pessoas, das quais 5.000 viviam em Jerusalém. Também é verdade qualitativamente. Das 29 yeshivot conhecidas que operaram na Terra de Israel no sec. XVIII, 24 estavam localizadas em Jerusalém. No que era essencialmente uma comunidade de estudiosos, esta é uma estatística altamente significativa. Outro aspecto significativo da vida judaica em Jerusalém no século XVIII foi a presença sefardita dominante. A presença asquenaze, que de qualquer modo era menos pronunciada, terminou em 1720 com a sua expulsão pelos governantes locais. A comunidade só foi restabelecida no final do século com a chegada dos seguidores do Vilna Gaon. A seguinte CRONOLOGIA de Jerusalém nos anos 1700 não aspira ser abrangente, mas sim ilustrativa. 1700-1750 1700 — Jerusalém era o principal centro judaico na Terra de Israel e tinha cerca de 1.500 judeus. 1700 — R. Yehudah HaChasid, da Polónia, chegou a Jerusalém com cerca de 1000 seguidores. 1702 — R. Rovigo de Modena, Itália, grande apoiante dos judeus de Israel, estabeleceu-se em Jerusalém. 1702 — R. Raphael Mordechai Malki, médico e líder comunitário, faleceu em Jerusalém. 1705 — Foram impostas sérias restrições contra os judeus de Jerusalém. 1708 — Os sábios de Jerusalém excomungaram R. Nechemiah Chayun pelas suas opiniões heréticas do Shabat. 1720 — Multidões árabes destroem a Sinagoga Yehudah HaChasid e o pátio Ashkenazi em Jerusalém. c.1720 — A comunidade sefardita enfrentou uma crise financeira ao ser responsabilizada pelas dívidas da comunidade asquenaze. 1724 — R. Chaim Yosef David Azulai nasceu em Jerusalém. c.1724 — R. Tuvia Cohen, também conhecido por Dr. Tobias Cohn, muda-se da Turquia para Jerusalém. 1727 — O Comité de Oficiais de Istambul para Jerusalém foi estabelecido para coordenar o apoio financeiro da comunidade judaica em Jerusalém. 1731 — Os judeus caraítas, principalmente de Damasco, regressaram a Jerusalém. 1737 — R. Immanuel Rikki, um influente Cabalista de Itália, mudou-se para Jerusalém. 1737 — O Beth El Yeshiva em Jerusalém, com um foco único no misticismo judaico, iniciou as suas operações. 1738 — R. Moshe Chagiz regressou a Jerusalém após quarenta anos como emissário na Europa. Final da década de 1730 — R. Shalom Sharabi mudou-se do Iémen para Jerusalém. 1742 — R. Chaim Ibn Attar, de Marrocos, estabeleceu-se em Jerusalém. 1747 — O recém-chegado líder Chassídico, R. Gershon de Kitov, mudou-se de Hebron para Jerusalém. 1750 - 1799 1751 — R. Shalom Sharabi tornou-se o chefe da Yeshiva Bet El em Jerusalém. 1755 — O R. Chaim Yosef David Azulai iniciou a sua primeira missão no estrangeiro como emissário em nome das comunidades judaicas. 1757 — R. Abraham Gershon de Kitov regressa à Europa de Leste… para voltar a casar. 1764 — Um grupo de Chassidismo liderado por R. Menachem Mendel de Peremyshlyany estabeleceu-se em Jerusalém. 1771 — O governante mameluco do Egito, em aliança com a Rússia, assumiu temporariamente o controlo de Jerusalém. 1773 — Aos judeus de Livorno, Itália, é oferecida a oportunidade de comprar Jerusalém ao governante mameluco do Egito. 1780 — O rabino David Pardo muda-se de Saraievo para Jerusalém. 1782 — O Cemitério Judaico do Monte das Oliveiras enfrentou novas medidas duras. 1799 — Os judeus de Jerusalém ajudaram a salvar a cidade das forças de Napoleão. 1799 — Jerusalém continuou a ser o principal centro judaico na Terra de Israel, contando agora com cerca de 5.000 judeus.
1780
Oriundo de uma família ibérica, o R. David Pardo mudou-se para Jerusalém em 1780, após ter servido durante décadas em várias comunidades dos Balcãs. O R. Pardo distinguiu-se pelo seu enfoque único na literatura Judaica do período dos Tannaim, ou seja, até finais do século II da Era Comum.